DNA da bala: veja como marcas deixadas nos projéteis ajudaram a polícia a identificar serial killer e ligar milícia a 46 mortes
06/12/2025
(Foto: Reprodução) Veja como marcas deixadas nos projéteis ajudaram a polícia a identificar serial killer
Uma ferramenta usada por peritos considerada um "banco de DNA" das balas usadas em crimes ajudou a descobrir o envolvimento de dois grupos criminosos em homicídios em série nos estados do Paraná e do Rio Grande do Norte.
Criado para identificar e mapear as “digitais” deixadas por armas de fogo em cenas de crime, o Sistema Nacional de Análise Balística (Sinab) permite que delegados e policiais civis reúnam provas, conectem investigações e acelerem a identificação de suspeitos.
Com ajuda do "banco de DNA" das balas, a polícia conseguiu comprovar a existência de:
um serial killer que atua em grupo no Paraná;
uma milícia, formada por policiais e outros agentes de segurança, no Rio Grande do Norte.
Esses casos se somam aos quase dez mil inquéritos já auxiliados pela ferramenta, que está em operação desde 2019 por meio de uma parceria do governo federal com os 26 estados e o Distrito Federal.
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Como funciona o sistema Sinab, chamado de 'banco de DNA' das balas
Reprodução/Arte g1
Homicídios em série no Paraná
Entre janeiro de 2022 e janeiro de 2025, uma sequência de assassinatos registrados em Curitiba e na Região Metropolitana seguiu um padrão muito semelhante. As vítimas eram abordadas por três ou quatro homens armados que circulavam em um carro com placas clonadas, vestidos com roupas que imitavam uniformes policiais e usando máscaras.
A execução ocorria de duas maneiras: ou no próprio local da abordagem, com múltiplos disparos feitos pelos criminosos, ou após o sequestro da vítima, que posteriormente era encontrada morta em outro ponto da região.
Sistema compara balas coletavas em diferentes cenas de crime
Reprodução/Arte g1
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Investigações conduzidas separadamente sobre o duplo homicídio de Marcelo Alves e Antônio Carlos Talamini e as mortes de Marlon Cezar, Thiago Harold Lordani e David Boni Palevoda identificaram esses mesmos elementos nos casos.
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“O confronto balístico voltou do Instituto de Criminalística dando positivo, informando que as armas usadas no homicídio do Marcelo foram as mesmas usadas no homicídio do Marlon, do Tiago e do Davi”, relata a delegada Magda Hofstaetter, da 1ª Delegacia de Homicídios de Curitiba. Foi nesse momento que o Sinab confirmou as suspeitas.
O exame feito nos projéteis recolhidos tanto nos locais dos crimes quanto nos corpos das vítimas permitiu a conexão entre seis homicídios distintos. Em todos eles foram encontradas balas disparadas pela mesma arma: uma pistola Luger calibre 9 mm.
Essa arma está associada a um criminoso identificado como Kainan Wesley, que atua vestido como policial e é suspeito, segundo a Polícia Civil do Paraná, de ser responsável por cerca de 30 mortes. Ele permanece foragido.
“A gente acabou descobrindo que ele é um dos chefes do tráfico de drogas na região do bairro Abranches, em Curitiba. Mas foi a partir do confronto que conseguimos colocar ele em todos esses casos, apontar a autoria e indiciar em todas as situações”, explica a delegada. Ela destaca que a arma ainda não foi apreendida e provavelmente continua sob posse de Kainan.
Balas diferentes foram comparadas pela ferramenta e identificaram ranhuras compatíveis.
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Milícia no Rio Grande do Norte
Outro grupo criminoso teve sua participação em assassinatos interligados pelo Sinab identificada em Natal e em municípios da Região Metropolitana da capital potiguar.
Ao todo, 46 homicídios investigados entre setembro de 2022 e maio de 2025 foram conectados graças às consultas ao banco de “DNA das balas”. As ranhuras encontradas em projéteis e cápsulas recolhidos em uma cena do crime corresponderam exatamente às de materiais balísticos de outras ocorrências.
Todos os casos estão associados a uma milícia formada por policiais e outros agentes de segurança que, segundo a Polícia Civil do RN, utilizavam armas de calibres 9 mm, .40, .45, .380, entre outros — todas mapeadas e interligadas pelo sistema balístico.
O trabalho resultou, até o momento, em três condenações por homicídio e oito por formação de milícia, conforme detalhou o delegado Cláudio Henrique Freitas de Oliveira, da 4ª Delegacia de Homicídios de Natal.
“Já tínhamos uma investigação de homicídio bem avançada quanto à autoria. Quando acessamos o Sinab, começou a dar positivo para outros casos, e percebemos que eles também apresentavam características similares”, afirma o delegado.
Passo a passo de como funciona o sistema Sinab, chamado de 'banco de DNA' das balas
Arte g1
Segundo ele, foram identificadas conexões diretas entre cinco homicídios dentro do conjunto de 46 pelos quais a milícia é investigada. Uma das armas usadas nas execuções foi apreendida e contribuiu para reforçar os vínculos entre os crimes.
“Isso facilita a instrução processual. Antigamente, dependíamos quase de uma ‘iluminação divina’ para decidir comparar um caso com outro. A grande vantagem do Sinab é justamente trazer essas coincidências balísticas ao nosso conhecimento, permitindo que aprofundemos a investigação. É um sistema otimizado que nos alerta”, explica Oliveira.
Ferramenta do Sistema Nacional de Análise Balística em funcionamento
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